Mortes Coletivas e a Justiça Divina

O Livro dos Espíritos
                           Livro III – Leis Morais
                        Cap. X - Lei de Liberdade
Fatalidade
Perguntas 851 a 867

851 – Haverá fatalidade nos acontecimentos da vida de acordo como sentido atribuído a este vocábulo? Em outras palavras, todos os acontecimentos são predeterminados? Neste caso, que vem a ser do livre-arbítrio?

-- A fatalidade só existe pela escolha que o Espírito fez, ao encarnar, de sofrer esta ou aquela prova. Ao escolhê-la, elege para si uma espécie de destino, que é a conseqüência mesma da posição em que se achará colocado. Refiro-me às provas físicas, porque, no tocante às provas morais e às tentações, o Espírito, conservando o livre-arbítrio quanto ao bem e ao mal, é sempre senhor de ceder ou de resistir. Ao vê-lo fraquejar, um Espírito bondoso pode vir em seu auxílio, embora não possa influir sobre ele de maneira a dominar-lhe a vontade. Um Espírito mau, isto é, inferior, ao lhe mostrar de forma exagerada um perigo físico, poderá abalá-lo e amedrontá-lo, mas nem por isso a vontade do Espírito encarnado ficará menos livre de quaisquer entraves.

852 – Há pessoas que parecem perseguidas por uma fatalidade, independente da maneira como procedem. A desgraça não estará no seu destino?

-- São talvez provas que devam sofrer e que elas mesmas escolheram. Ainda uma vez lançais à conta do destino o que muitas vezes é apenas conseqüência de vossas próprias faltas. Nos males que vos afligem, tratai de conservar pura a consciência e já vos sentireis bastante consolados.

Nota:
As idéias justas ou falsas que fazemos das coisas nos levam a ser bem ou malsucedidos, de acordo com o nosso caráter e a nossa posição social. Achamos mais simples e menos humilhante para o nosso amor-próprio atribuir nossos fracassos à sorte ou ao destino, do que à nossa própria falta. A influência dos Espíritos contribui algumas vezes para isso; entretanto, sempre podemos nos livrar dessa influência repelindo as idéias que eles nos sugerem, quando más.

853 – Algumas pessoas só escapam de um perigo mortal para cair em outro. Parece que não podiam escapar da morte. Não há nisso fatalidade?

-- Fatal, no verdadeiro sentido do termo, só o instante da morte. Chegado esse momento, de uma forma ou de outra, não podeis livrar-vos dele.

853-a – Assim, qualquer que seja o perigo que nos ameace, não morreremos se a hora da morte ainda não chegou?

-- Não; não perecerás e tens disso milhares de exemplos. Quando, porém, chegar a hora da tua partida, nada poderá impedir que partas. Deus sabe com antecedência qual o gênero de morte que te levará da Terra e muitas vezes o teu Espírito também o sabe. Já que isso lhe foi revelado ao fazer a escolha desta ou daquela existência.

854 – Por ser fatal a hora da morte, serão inúteis as precauções que tomemos para evitá-la?

-- Não, pois a precauções que tomais vos são sugeridas com o fim de evitardes a morte que vos ameaça. São um dos meios empregados para que ela não ocorra.

855 – Qual o objetivo da Providência ao nos fazer correr perigos que não devem ter nenhuma conseqüência?

-- O fato de tua vida ser posta em perigo constitui um aviso que tu mesmo desejaste, a fim de te desviares do mal e te tornares melhor. Se escapas desse perigo, refletes mais ou menos seriamente, ainda sob a influência do risco que correste, em te melhorares, conforme seja mais ou menos forte sobre ti a influência dos bons Espíritos. Vindo em seguida o mau Espírito – digo mau, subentendendo o mal que ainda exista nele – pensas que escaparás igualmente de outros perigos e deixas que tuas paixões se desencadeiem novamente. Por meio dos perigos que correis, Deus vos lembra a vossa fraqueza e a fragilidade da vossa existência. Se examinardes a causa e a natureza do perigo, vereis, na maioria das vezes, que suas conseqüências teriam sido a punição de uma falta cometida ou de um dever negligenciado. Deus vos adverte dessa forma para que reflitais e vos corrijais.

856 – O Espírito sabe previamente qual o gênero de morte que irá sofrer?

-- Sabe que o gênero de vida que escolheu o expõe a morrer mais desta maneira do que de outra. Sabe igualmente quais as lutas que terá de sustentar para evitar a morte e que, se Deus o permitir, não sucumbirá.

857 – Há homens que afrontam os perigos dos combates certos de que sua hora ainda não chegou. Haverá algum fundamento nessa confiança?

-- Com muita freqüência o homem tem o pressentimento do seu fim, como pode ter o de que ainda não morrerá. Esse pressentimento lhe vem de seus Espíritos protetores, que assim o advertem para que esteja pronto a partir, ou lhe fortalecem a coragem nos momentos em que ela se torna mais necessária. Pode vir-lhe também da intuição que tem da existência que escolheu, ou da missão que aceitou e que sabe que terá de cumprir.

858 – Por que razão aqueles que pressentem a morte geralmente a temem menos do que os outros?

-- Quem teme a morte é o homem, não o Espírito. Aquele que a pressente pensa mais como Espírito do que como homem. Compreende ser ela a sua libertação e a espera.

859 – Se a morte não pode ser evitada quando tem de ocorrer, dar-se-á o mesmo com todos os acidentes que nos sobrevêm no curso da vida?

-- Geralmente são fatos muito insignificantes, a fim de que vos possamos prevenir deles e fazer que os eviteis algumas vezes, dirigindo o vosso pensamento, pois nos desagrada o sofrimento material. Mas isso é pouco relevante para a vida que escolhestes. A fatalidade, verdadeiramente, só existe quanto ao momento em que deveis aparecer e desaparecer deste mundo.

859-a – Haverá fatos que devam acontecer inevitavelmente e que a vontade dos Espíritos não possa afastar?

-- Sim, mas que tu viste e pressentiste quando, na condição de Espírito desencarnado, fizeste a tua escolha. Entretanto, não creias que tudo o que acontece esteja escrito, como se costuma dizer. Muitas vezes um acontecimento qualquer é a conseqüência de um ato que praticaste por tua livre vontade, de modo que, se não o houvesses praticado, o fato não se teria dado. Se queimas o dedo, isso nada mais é que o resultado de tua imprudência e efeito da matéria. Só as grandes dores, os acontecimentos importantes que podem influir sobre o moral, são previstos por Deus, porque são úteis à tua depuração e à tua instrução.

860 – Pode o homem, pela sua vontade e por seus atos, evitar acontecimentos que deveriam realizar-se e vice-versa?

-- Pode, desde que esse aparente desvio possa caber na vida que escolheu. Além disso, para fazer o bem que lhe cumpre – único objetivo da vida – é permitido ao homem impedir o mal, sobretudo aquele que possa contribuir para a produção de um mal maior.

861 – Ao escolher sua existência, o homem que comete um homicídio já sabia que se tornaria assassino?

-- Não. Escolhendo uma vida de luta, sabe que terá oportunidade de matar um de seus semelhantes, mas ignora se o fará, visto caber quase sempre a ele, antes de cometer o crime, a deliberação de praticá-lo. Ora, aquele que delibera sobre uma coisa é sempre livre de fazê-la ou não. Se soubesse previamente que, como homem, deveria cometer um assassínio, é porque o Espírito estaria predestinado a isso. Sabei, portanto, que ninguém é predestinado ao crime e que todo crime, como qualquer outro ato, resulta sempre da vontade e do livre-arbítrio.
 Aliás, sempre confundis duas coisas muito distintas: os acontecimentos materiais da vida e os atos da vida moral. Se por vezes há fatalidade, é apenas com relação aos acontecimentos materiais, cuja causa está fora de vós e que independem da vossa vontade. Quanto aos atos da vida moral, esses emanam sempre do próprio homem que, por conseguinte, tem sempre a liberdade de escolher. Em relação a tais atos, portanto, nunca há fatalidade.
 862 – Há pessoas que nunca obtêm sucesso em coisa alguma e que parecem perseguidas por um mau gênio em todas as suas ações. Não se pode chamar a isso fatalidade?

-- É fatalidade, se assim quiseres chamá-la, mas que decorre do gênero da existência escolhida. É que essas pessoas quiseram ser provadas por uma vida de decepções, a fim de exercitarem a paciência e a resignação. Não creiais no entanto, que essa fatalidade seja absoluta. Resulta muitas vezes do caminho falso que tomaram, em desacordo com suas inteligências e aptidões. Quem pretende atravessar um rio a nado, sem saber nadar, tem grande probabilidade de se afogar. Dá-se a mesma coisa com a maioria dos acontecimentos da vida. Se o homem só se dispusesse à realização de coisas compatíveis com as suas faculdades, triunfaria quase sempre. O amor-próprio e a ambição fazem que ele se perca, desviando-o do caminho que lhe é próprio e levando-o a considerar vocação o simples desejo de satisfazer a certas paixões. Fracassa por sua culpa. Mas, em vez de admitir o erro, prefere acusar a sua estrela. Aquele que seria bom operário e ganharia honestamente a vida, mas que se fez mau poeta, morre de fome. Haveria lugar para todos, se cada um soubesse colocar-se no lugar que lhe compete.
 863 – Frequentemente, os costumes sociais não obrigam o homem a seguir determinado caminho, em vez de outro? Nesse caso, não estará ele submetido ao controle da opinião geral quanto à escolha de suas ocupações? Aquilo que se chama respeito humano não constitui obstáculo ao exercício do livre-arbítrio?
 -- São os homens que fazem os costumes sociais, e não Deus. Se eles se submetem a tais costumes, é porque lhes convém. Essa submissão, portanto, representa um ato de livre-arbítrio , visto que, se quisessem, poderiam livrar-se deles. Por que, então, se queixam? Não são os costumes sociais que os homens devem acusar, e sim o seu tolo amor-próprio, que faz com que prefiram morrer de fome a infringi-los. Ninguém lhes leva em conta esse sacrifício feito à opinião pública, ao passo que Deus lhes levará em conta o sacrifício que fizerem de suas vaidades. Isto não quer dizer que o homem deva afrontar sem necessidade aquela opinião, como fazem certas pessoas em que há mais originalidade do que verdadeira filosofia. Há tanto desatino em procurar alguém ser apontado a dedo ou exibido como animal curioso, quanto bom senso  naquele que desce voluntariamente e sem murmurar, desde que não possa manter-se no alto da escala.

864 – Há pessoas para as quais a sorte é contrária, enquanto outras parecem favorecidas por ela, visto que tudo lhes sai bem. A que se deve isso?
-- Quase sempre é porque essas pessoas sabem conduzir-se melhor na vida. Mas também pode ser um gênero e prova. O sucesso as embriaga; confiam em seu destino e muitas vezes pagam mais tarde esse sucesso, mediante reveses cruéis, que poderiam ter evitado com a prudência.

865 – Como explicar a boa sorte que favorece certas pessoas em circunstâncias que independem completamente da vontade e da inteligência delas? No jogo, por exemplo?
 -- Alguns Espíritos escolheram previamente certas formas de prazer. A sorte que os favorece é uma tentação. Aquele que ganha como homem, perde como Espírito; é uma prova para o seu orgulho e para a sua cupidez.
 866 – Então, a fatalidade que parece presidir aos destinos materiais de nossa vida também é resultante do nosso livre-arbítrio?
 -- Tu mesmo escolheste a tua prova. Quanto mais rude ela for e melhor a suportares, mais te elevarás. Os que passam a vida na abundância e na felicidade humana são Espíritos de ânimo fraco, que permanecem estacionários. Assim, o número de infortunados é muito maior do que o dos felizes deste mundo, considerando-se que os Espíritos, na sua maioria, procuram as provas que lhes sejam mais proveitosas. Eles vêem muito bem a futilidade das vossas grandezas e prazeres. Aliás, a vida mais venturosa é sempre agitada, sempre atormentada, mesmo na ausência da dor.
 867 –  De onde vem a expressão: "Nascer sob uma boa estrela"?
 -- Antiga superstição, segundo a qual as estrelas estariam ligadas ao destino de cada homem. Alegoria que algumas pessoas cometem a tolice de tomar ao pé da letra.
Parte 1:



 Parte 2:




 Parte 3:

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